08 dezembro 2008

MANIA DE DESTRUIR ÁRVORES

O texo abaixo foi publicado no jornal O Semanário, de Irecê, já faz algum tempo, mas como as atitudes criticadas nele e seus efeitos negativos persistem, resolvemos publicá-lo mais uma vez, como forma de sensibilizar o povo rumo à reflexão.
Em nossa região, faz parte do hábito político dos administradores públicos levar à risca aquela lição de O Príncipe, de Maquiavel, que diz ser o melhor ao príncipe que conquistou um reino, destruir tudo que puder lembrar o seu antecessor. Péssima lição, já que quem perde é o povo. Mas, como a política em vigor na maioria dos municípios da região é a da malversação do dinheiro público, da corrupção crônica, raramente sobra alguma coisa nos municípios para ser destruída pelos gestores.

Com os municípios em ruínas, não havendo muito que destruir, virou moda na região os prefeitos dizimarem as árvores das ruas e avenidas. Todo início de mandato é a mesma coisa: um caminhão da prefeitura repleto de peões famigerados avança de rua a rua mutilando árvores e arrancando-as pela raiz. Depois da devastação, os mesmos peões gafanhotos retornam plantando mudas de uma única espécie vegetal, onde outrora havia robustas árvores.

Bom, mas a estupidez do gesto desses “administradores da coisa pública” não se resume apenas à mudança de visual e de clima gerada pela eliminação da cobertura verde das zonas urbanas. Além de a empreitada alterar o clima ambiente, a mania de uniformizar a zona urbana com uma só espécie vegetal provoca um desequilíbrio ecológico que vem sendo sentido há muito tempo na região. Não precisa ter boa memória para enumerar as pragas que proliferaram sem controle nas últimas décadas: os potós, com sua secreção ácida, que aterrorizaram a região; os besouros coleópteros que importunaram o sossego dos lares; a praga de fungos que destruiu muitos milhares de mangueiras etc. Mesmo assim, entra prefeito, sai prefeito, cortam-se as mangubas e plantam-se apenas algarobas; derrubam-se as algarobas e plantam-se somente o fícus...

Para garantir a biodiversidade, o equilíbrio entre espécies, a qualidade do ar e do clima, deve haver em uma zona urbana pelo menos 40 espécies de árvores convivendo no mesmo espaço. A cada espécie vegetal corresponde a presença de um número significativo de aves, insetos, fungos e bactérias. Quanto maior o número de árvores, maior a biodiversidade, maior o equilíbrio ambiental. Dificilmente haverá a proliferação de pragas.

É importante salientar também que nem toda espécie de árvore serve para compor a cobertura vegetal urbana. As espécies devem ser escolhidas mediante estudo e impacto ambiental. A título de exemplo, a mesma engenharia florestal que autorizou a criação de florestas de eucalipto em Brasília, com o fim de melhorar o clima, por lá muito seco, ordenou a extinção de tais florestas ao constatar que o eucalipto tem raízes profundas, extrai muita água do solo e tem baixa transpiração, o que tornou o clima da capital ainda mais seco.

A preservação da arborização urbana, quando ignorada, pode trazer transtornos para toda a população, gerando problemas de saúde que oneram tanto o cidadão quanto o município. Na verdade, os administradores, no lugar de em todo início de mandato se preocupar em vestir um novo uniforme verde no município, deveriam sim cuidar da saúde das espécies existentes e já adaptadas à zona urbana e executar um planejamento para o plantio de novas espécies, evitando com isso o desequilíbrio ecológico e todas as suas conseqüências. Quanto à população, acreditamos que sua participação cidadã seria de imenso valor na fiscalização das ações das prefeituras e no controle das espécies plantadas. Sabe-se ainda, pela experiência, que muitos problemas ecológicos ultrapassam o perímetro urbano. A solução desses problemas passará necessariamente pela preservação de matas, rios, riachos e espécies animais. Pensando assim, como diz um amigo ecologista aqui do cerrado, a consciência ecológica começa dentro do nosso quintal, então, vamos cuidar pelo menos dos grandes quintais que são os nossos municípios para, consequentemente, melhorar o quintal de todos que é o mundo.

Alan Oliveira Machado (março de 2000)

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